Vivemos como se o tempo estivesse ao nosso dispor. Todos sabemos que não, mas não é isso que fazemos na prática. Não vou hoje ali, vou amanhã. Não combinamos isto este Verão, fica para um próximo. Acalentamos todos o desejo de chegarmos a uma idade avançada a tricotar e a ler histórias aos netos, e se não vivemos este dia muito bem, amanhã também não será o último.
“Foi tudo muito rápido”, foi a frase mais repetida nestes últimos dias. No carro, falávamos de como no espaço de uma semana se deixou de recear uma súbita alta médica e arranjar alternativas de apoio domiciliário, para se falar em cuidados paliativos. Na segunda-feira tudo parecia mais ou menos igual. Na terça, uma febre do mais novo, uns telefonemas, “Não vamos hoje. Vamos amanhã ver a tia”.
Secretamente albergava o desejo de – numa passagem para uma enfermaria – os miúdos ainda poderem entrar. Segundos depois desta fotografia, uma sms do Tiago que tinha subido antes de mim: “A tia pode partir a qualquer momento”.
Subi minutos depois. As campaínhas de acesso. As portas que batem em silêncio. Os sussurros de quem está. As últimas frases que se dizem. O pesar da espera. Os meninos que já não entraram. O dia de visita que nunca mais se repetirá.
“Foi tudo muito rápido. Foi tudo muito rápido.”
O tempo de Deus não é o nosso.
“(…) um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia.” – II Pedro 3:8